Via EU Observer
Em 25 de março, o New York Times teve acesso a uma fita de segurança da embaixada da Hungria em Brasília, capital do Brasil, que mostra o ex-presidente brasileiro de extrema-direita Jair Bolsonaro escondido por dois dias dentro do prédio no início de fevereiro, após ter seu passaporte retirado pela polícia e enfrentar a possibilidade de ser preso.
Bolsonaro, que perdeu o poder no final de 2022 após ser derrotado pelo atual presidente Luís Inácio Lula da Silva, está atualmente envolvido em várias investigações criminais, como por falsificar registros de vacinação contra a Covid, por tentar desviar presentes estrangeiros caros e por planejar um golpe junto com os militares para derrubar o governo democraticamente eleito.
Em 8 de janeiro de 2023, milhares de seus apoiadores invadiram prédios federais, principalmente o Supremo Tribunal Federal e a residência presidencial oficial, deixando um rastro de destruição enquanto exigiam uma intervenção militar para reintegrar Bolsonaro como presidente – semelhante, porém ainda mais perigoso do que a invasão do Capitólio nos EUA dois anos antes.
Bolsonaro deu várias desculpas para se “abrigar” na embaixada, como ter sido convidado pela embaixada para trabalhar lá ou, de acordo com seu advogado, “para manter contato com funcionários do país amigo” e “obter atualizações sobre o cenário político de ambas as nações”. O jornalista Octavio Guedes observou que Bolsonaro passou um tempo na embaixada durante o carnaval do Brasil, de 12 a 14 de fevereiro, mas ele é conhecido por “trabalhar até tarde da noite”. Pelo contrário. O Palácio do Planalto [Presidência] fechava cedo, então isso não bate com a nota da defesa de que Bolsonaro estava trabalhando dois dias seguidos, quase como uma festa rave, na Embaixada da Hungria”.
O fato relevante, no entanto, é o papel de Orbán, que havia declarado no Twitter que admirava o ex-presidente brasileiro alguns dias antes da festa do pijama na embaixada. Esse fato não apenas ressalta a complexa dinâmica da política internacional, mas também destaca a crescente influência do primeiro-ministro húngaro Viktor Orbán no movimento global de extrema direita. Considerado um espinho no lado da União Europeia ao apoiar abertamente Bolsonaro, Orbán não apenas mostra sua influência na política brasileira, mas também envia uma mensagem clara à União Europeia e ao mundo sobre sua ampla rede de apoio e aliados além das fronteiras da Hungria.
Uma vitória de Donald Trump nas próximas eleições nos EUA só aumentaria o poder e a capacidade de Orbán de pressionar a UE em uma série de tópicos sensíveis. Ele ganharia um aliado poderoso que tem uma compreensão semelhante do mundo. Não é de surpreender que Orbán conte com Trump para ajudar a Rússia a derrotar a Ucrânia e, portanto, fortalecer a extrema direita global que tem Putin como um de seus líderes mais proeminentes e que tem a Hungria como um poderoso aliado dentro da UE.
Ódio mútuo a Soros
Esta não é a primeira vez que a Hungria e o Brasil estão alinhados. Em 2019, o deputado Eduardo Bolsonaro, filho de Jair Bolsonaro, viajou para a Hungria para criticar George Soros (um inimigo favorito da extrema direita antissemita) e defender uma aliança global ideológica – que está se mostrando cada vez mais forte.
Embora as ações de Orbán no cenário internacional possam reforçar sua imagem como um ator importante internacionalmente, elas também ocorrem em um momento em que sua popularidade no país está enfrentando desafios. Ao projetar influência além das fronteiras da Hungria, Orbán busca reafirmar sua relevância política e demonstrar sua capacidade de moldar narrativas em uma escala mais ampla, apesar de enfrentar críticas e oposição em seu próprio país.
No contexto do movimento global de extrema direita, o apoio de Orbán a Bolsonaro ressalta a interconexão de líderes com ideias semelhantes que compartilham ideologias e objetivos semelhantes. Esse alinhamento de interesses entre as figuras da extrema direita significa um esforço conjunto para desafiar as normas e instituições estabelecidas, representando um desafio significativo para a ordem política tradicional e sinalizando uma mudança para agendas mais nacionalistas e populistas. O crescimento do AfD neonazista na Alemanha, da extrema direita na Holanda com Geert Wilders ou na França, bem como o crescimento do Chega em Portugal, mostram que a extrema direita está mais do que viva.
As eleições para o Parlamento Europeu em junho provavelmente consolidarão o crescimento do extremismo político de direita, com uma presença maior de partidos eurocéticos, racistas, abertamente fascistas e muitas vezes pró-Rússia, colocando em risco a segurança de todo o continente. O papel covarde e desajeitado da Alemanha na expansão do esforço de guerra na Ucrânia não ajuda o cenário político europeu em geral.
O nexo Bolsonaro-Orbán não se trata apenas de dois líderes. Trata-se de ideologia, poder e o delicado equilíbrio das relações internacionais. E sobre manter aliados em todo o mundo, mesmo aqueles cujo destino político não é exatamente brilhante – mas que, no entanto, mantêm uma base política importante e ativa.
Enquanto o destino de Bolsonaro está em jogo, o movimento calculado de Orbán reverbera muito além do Brasil. O movimento global de extrema direita observa, e a UE luta com seus próprios demônios. Nesse teatro sombrio, alianças são forjadas e mensagens são enviadas – um aperto de mão de cada vez.