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2 de julho: o dia da independência
Antifascismo

2 de julho: o dia da independência

A histórica resistência baiana contra a metrópole portuguesa

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O dia 2 de julho de 1823 é uma data de enorme relevância histórica, pois marca a vitória das forças brasileiras sobre as tropas portuguesas na Bahia, consolidando o processo de independência do Brasil. Embora a independência tenha sido proclamada oficialmente em 7 de setembro de 1822 por Dom Pedro I, a Bahia permaneceu como um dos últimos redutos do poder colonial português. Salvador, então um centro estratégico para o domínio lusitano, se tornou o palco de uma resistência acirrada, onde os confrontos foram intensos e prolongados.

A luta pela independência na Bahia começou antes mesmo de 1823, com a organização de milícias formadas por camponeses, indígenas, escravizados, libertos e trabalhadores urbanos. Essas forças populares desempenharam papel crucial nos combates. A sociedade baiana, tomada e movida pelo sentimento da defesa de sua independência, foi decisiva para enfrentar o domínio colonial. A entrada das tropas brasileiras em Salvador no dia 2 de julho foi resultado de meses de batalhas e cercos.

Durante a Revolução do Porto, em Salvador e outras vilas baianas, setores pobres da sociedade ousavam intervir por meio de manifestações e aclamações públicas. Um exemplo importante foi o que ocorreu em 10 de fevereiro de 1821, quando uma multidão insatisfeita com a composição da Junta Provisória da Bahia forçou a inclusão do general Manoel Pedro Freitas Guimarães no grupo de autoridades recém-empossadas.

O clima de tensão com os portugueses aumentou, levando a episódios como o da dispersão da procissão de São José em 19 de março de 1822, protagonizada por jovens negros em protesto contra a chegada de tropas portuguesas. O estopim do processo de ruptura definitiva aconteceu no dia 25 de junho de 1822, em Cachoeira, quando uma embarcação portuguesa atirou contra uma multidão reunida que celebrava a aclamação de Dom Pedro, abrindo um conflito armado que marcou o início da Guerra de Independência na Bahia.

A guerra contou com a adesão de diversos setores populares, desde pequenos proprietários até escravizados, que se alistaram voluntariamente nos batalhões do Exército Libertador, que contava com exemplos emblemáticos como batalhões formados por vaqueiros sertanejos. Mas, as tensões internas também se manifestavam no Exército, com deserções e motins provocados por castigos corporais e alimentação precária. a, o Exército também foi palco de tensões internas, como deserções e motins, provocados por condições adversas como castigos corporais e alimentação precária.

Além disso, a guerra desencadeou processos de rebeldia popular que iam além do enfrentamento ao domínio português. Escravizados, indígenas e pobres livres realizaram levantes e protagonizaram episódios de resistência que desafiaram as estruturas sociais e políticas. Episódios como o ataque de 200 escravizados às linhas brasileiras e os saques indígenas em Água Fria refletem as contradições que tensionavam o processo. Para as elites baianas, a guerra representava um paradoxo: era necessário armar, organizar e mobilizar as camadas sociais exploradas e oprimidas para garantir a vitória, mas isso também despertava receios quanto à ordem social. Embora o discurso patriótico fosse amplamente utilizado, existia o medo constante de que o conjunto desses setores passassem a agir por conta própria e não interrompessem o acerto de contas com a derrota dos portugueses.

A participação popular jogou com peso decisivo para consolidar o sucesso militar sobre os portugueses, mas o desfecho do processo, ou, onde ele foi interrompido, deu vitória aos interesses das elites. Consolidou um projeto conservador de independência que mantinha os indígenas, o povo negro e os pobres sob profunda exploração e opressão. Ainda assim, as ações das camadas populares deixaram marcas na formação do Império como resultado de um processo que não seria possível sem a luta de maioria.

A vitória brasileira em 2 de julho é celebrada até hoje na Bahia como o verdadeiro marco da independência do Brasil. A data reflete uma disputa da história, destacando o papel das lutas populares na consolidação do processo de independência, apagado pela narrativa oficial construída pelas elites vitoriosas que assumiram o papel de conservação de uma ordem política, econômica e social que não levava até as últimas consequências as aspirações daqueles que lutavam contra a opressão e a exploração. Os desfiles cívicos que ocorrem anualmente em Salvador e em outras cidades baianas não apenas homenageiam os que lutaram, mas também reafirmam a importância da memória coletiva, não apenas como lembrança, mas como instrumento de manter vivas as lutas que seguem vivas ainda hoje na luta por uma independência verdadeira para a negritude, os povos indígenas, as mulheres e o conjunto das trabalhadoras e trabalhadores.

A disputa da memória e da história são também parte do projeto conservador que busca, pelo apagamento do peso decisivo da entrada em cena do povo pobre, explorado e oprimido, inscrever seus generais, imperadores e barões como heróis, desautorizando e desacreditando-o de sua capacidade autônoma de luta. É preciso atravessar os limites impostos ainda hoje pelo projeto das elites econômicos na luta por uma verdadeira independência dos debaixo, apostando na organização e mobilização populares, mantidas acesas pela memória daqueles que lutaram.

Saiba Mais

A Independência do Brasil na Bahia e os heróis populares do dois de julho (SCIELO)

Reflexões acerca das lutas pela Independência na Bahia: A contenda entre Brasileiros e Portugueses (ANPUH-BA)

A 7 de setembro de 1822 e a 2 de julho de 1823: em torno das comemorações das Independências do Brasil (UNICAMP)

Os centenários: 7 de Setembro e 2 de Julho na Bahia, Brasil (1922-1923) (Anais do Museu Histórico Nacional)

2 de julho de 1823: grande marco na luta pela independência do Brasil (ACEB)

A guerra que orgulha a Bahia (IPEA)

GUERRA FILHO, Sérgio Armando Diniz. O POVO, A GUERRA, A LIBERDADE: UM PROGRAMA POLÍTICO POPULAR DURANTE A GUERRA DE INDEPENDÊNCIA NA BAHIA (1822-1823). 2015.

KRAAY, Hendrik. Entre o Brasil e a Bahia: As comemorações do Dois de Julho em Salvador, século XIX. Afro-Ásia, n. 23, 2000.

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