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Israel afunda o Oriente Médio no caos
Antifascismo

Israel afunda o Oriente Médio no caos

Violência sionista aliada ao imperialismo promove cada vez mais agressões na região

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Via Viento Sur

Tempo de leitura: 11 minutos.

Como o presidente estadunidense George W. Bush ao lançar seu exército para invadir o Iraque em 2003, Benyamin Netanyahu, o primeiro-ministro israelense acusado pela Corte Penal Internacional (CPI) de crimes de guerra e crimes contra a humanidade, tem como objetivo, muito além do Irã, “redesenhar o mapa do Oriente Médio”. Se os neoconservadores pensavam que a tomada de Bagdá abriria uma era democrática em toda a região, os líderes de Tel Aviv se veem em uma luta apocalíptica contra o “Mal”, usando como pretexto a defesa da chamada “civilização judeu-cristã”. Mas essa nova agressão israelense alimenta as chamas dos conflitos que tornarão a região e os países inviáveis. Israel se gaba de travar uma guerra em “sete frentes”: Gaza, Líbano, Cisjordânia, Iraque, Irã, Iêmen e Síria; poderia ter incluído Jerusalém Oriental, onde a expansão dos assentamentos e a confiscação de propriedades palestinas se intensificam.

O Irã é o principal alvo dos ataques recentes sob o falso pretexto da ameaça nuclear, tão falso quanto foram as armas de destruição em massa escondidas por Saddam Hussein. Os bombardeios israelenses ocorrem enquanto as negociações sobre o programa nuclear iraniano e o levantamento das sanções econômicas continuavam entre Washington e Teerã, com mediação omanense. Assim, pela segunda vez, Israel sabota uma saída diplomática.

Já em maio de 2018, estimulado por Netanyahu, Donald Trump retirou a assinatura dos EUA do tratado nuclear iraniano assinado três anos antes, que havia sido respaldado em duas resoluções pelo Conselho de Segurança das Nações Unidas. Na mesma linha, o presidente americano intensificou as sanções contra o Irã, muito mais duras do que as estabelecidas antes de 2015, atingindo qualquer empresa que faça negócios com aquele país, seja americana ou não, proibindo de fato Teerã de vender seu petróleo e produtos petroquímicos. Um estrangulamento progressivo de um país membro das Nações Unidas, medidas ilegais que provocaram poucas reações da “comunidade internacional”. Quanto à ideia de que o Irã estaria às vésperas de possuir a arma nuclear, basta reproduzir algumas declarações complacentemente veiculadas pela mídia para perceber que o fantasma não é novidade (ver quadro abaixo).

Anthony Cordesman e Khalid Al-Rodhan são dois pesquisadores que, em seu livro publicado em junho de 2006 Iran’s Weapons of Mass Destruction: The Real and Potential Threat, fazem um levantamento das previsões dos serviços de inteligência e autoridades sobre o tempo em que o Irã provavelmente teria acesso a armas nucleares. Os exemplos a seguir foram reportados por Alain Gresh em seu blog Nouvelles d’Orient há quase 20 anos (Alain Gresh, “Quand l’Iran aura-t-il l’arme nucléaire ?”, Nouvelles d’Orient, 4 de setembro de 2006).

  • Final de 1991: relatórios ao Congresso e avaliações da CIA estimam que há “alta probabilidade de que o Irã tenha adquirido todos ou praticamente todos os componentes necessários para fabricar duas ou três bombas nucleares”. Um relatório de fevereiro de 1992 na Câmara dos Representantes sugeria que essas duas ou três bombas estariam operacionais entre fevereiro e abril de 1992.
  • 24 de fevereiro de 1993: o diretor da CIA, James Woolsey, afirmou que o Irã estava a oito ou dez anos de poder produzir sua própria bomba nuclear, mas que com ajuda externa poderia se tornar uma potência nuclear antes disso.
  • Janeiro de 1995: o diretor da Agência de Controle de Armas dos EUA, John Holum, testemunhou que o Irã poderia ter a bomba em 2003.
  • 5 de janeiro de 1995: o secretário de Defesa, William Perry, afirmou que o Irã poderia estar a menos de cinco anos de construir uma bomba nuclear, embora “a velocidade… dependerá de como trabalhem para adquiri-la”.
  • 29 de abril de 1996: o primeiro-ministro israelense Shimon Peres afirmou que “acredita que dentro de quatro anos eles (Irã) poderiam ter armas nucleares”.
  • 21 de outubro de 1998: o general Anthony Zinni, chefe do Comando Central dos EUA, afirmou que o Irã poderia ter capacidade para lançar bombas nucleares em cinco anos. “Se eu fosse um apostador, diria que estarão operacionais em cinco anos, que terão as capacidades”.
  • 17 de janeiro de 2000: uma nova avaliação da CIA sobre as capacidades nucleares iranianas afirmava que a CIA não descartava a possibilidade de o Irã já possuir armas nucleares. A avaliação baseava-se no reconhecimento da CIA de que não consegue rastrear com precisão as atividades nucleares iranianas e, portanto, não pode descartar essa possibilidade.

Inversão da culpa

Por várias décadas, Teerã foi apresentado invariavelmente como a principal ameaça à estabilidade do Oriente Médio, tanto por suas ambições nucleares quanto pela natureza islâmica de seu regime. Ouvimos repetidamente Benyamin Netanyahu martelar essa afirmação, inclusive na Assembleia Geral da ONU, mesmo enquanto realizava uma limpeza étnica em Gaza e bombardeava cidades e vilarejos do sul do Líbano e bairros inteiros de Beirute. Embora essa retórica tenha sido apoiada por muito tempo pela Arábia Saudita, a reação de Riad — primeira capital a denunciar a ofensiva israelense — e depois de outros países do Golfo, sublinha o desejo de estabilidade dos países da região. Quem teria a ingenuidade, para não dizer má-fé, de acreditar que esse papel de ameaça regional caberia a um Estado da região que não seja Israel?

Essa ameaça israelense é ainda mais incontrolável porque, surpresa!, é apoiada sem ressalvas pelas chancelarias ocidentais. Fechado o parêntese que mal havia se aberto para criticar Tel Aviv pelo genocídio que vem cometendo há 20 meses em Gaza; desaparecida qualquer tentativa de traçar linhas vermelhas para os líderes israelenses, mesmo que frequentemente isso significasse incriminar somente Netanyahu para preservar a inocência israelense, enquanto as forças políticas do país e boa parte da opinião pública apoiavam sua política em Gaza. A união sagrada ocidental está de volta, invocando novamente o famoso “direito de Israel de se defender”, em total violação do direito internacional.

O programa nuclear israelense e a categórica recusa de Tel Aviv ao controle do Organismo Internacional de Energia Atômica (OIEA) nunca incomodaram os líderes ocidentais. Em sua entrevista coletiva de sexta-feira, 13 de junho, o presidente francês Emmanuel Macron não disse uma palavra sobre as vítimas civis iranianas, enquanto o número de mortos já chegava a 224, sugerindo que apenas instalações militares e nucleares foram atacadas por Israel. No auge da inversão da culpa, ele imputou ao Irã “grande responsabilidade pela desestabilização de toda a região”. Parecia ouvir a ex-primeira-ministra israelense Golda Meir acusar os “árabes” de obrigar os israelenses a “matar seus filhos”.

Uma ameaça muito maior pesa sobre a população civil iraniana, assim como sobre os países da região enquanto durarem os bombardeios israelenses: a de uma catástrofe nuclear e ecológica. A usina de enriquecimento de urânio de Natanz, situada entre as cidades de Kashan e Isfahan, foi atingida na sexta-feira, 13 de junho, por bombardeios israelenses. Situação que o diretor do OIEA, Rafael Grossi, classificou como “extremamente preocupante”. Se a fome organizada em Gaza mal faz com que os líderes ocidentais ergam uma sobrancelha, será que um risco de radiação para as populações do Oriente Médio os fará reagir?

Fazer esquecer Gaza

Ao abrir essa nova frente, Israel confirmou a ruptura com sua doutrina militar estratégica que defendia guerras curtas e contra um número limitado de oponentes. Hoje, não busca o fim das hostilidades, mas sua extensão, mesmo violando acordos que ratificou. Assim, Tel Aviv assinou um texto sobre o cessar-fogo com o Líbano que entrou em vigor em 27 de novembro de 2024. Apesar disso, continua ocupando parte do território e cometeu 1.500 violações do cessar-fogo entre essa data e 3 de abril de 2025, sem que a França, que participa da supervisão do acordo, tenha encontrado algo a reprovar.

Em Gaza, a trégua entrou em vigor em 19 de janeiro e permitiu a libertação de inúmeros reféns e centenas de presos políticos palestinos. Mas Israel a violou e retomou unilateralmente os bombardeios em 18 de março, demonstrando o pouco caso que faz até mesmo dos reféns. Mais uma vez, nem os Estados Unidos nem o Ocidente protestaram, mas culparam o Hamas. Não é trivial que o ataque contra o Irã tenha sido desencadeado nas 48 horas após um apagão total em Gaza, um corte de todos os meios de telecomunicação depois que Israel inutilizou um cabo de fibra óptica. Separada do mundo, Gaza, que começava a ocupar o lugar que lhe caberia na cobertura midiática, poderia desaparecer das manchetes e o genocídio continuar sob o olhar alheio. Durante os três dias em que durou esse apagão total, muitas pessoas, frequentemente jovens, foram assassinadas pelo exército israelense enquanto buscavam ajuda humanitária no corredor de Netzarim para alimentar suas famílias vítimas da fome organizada. Seu sangue misturou-se com a poeira branca vital que escapou dos sacos de farinha. Entre eles, Obeida, sobrinho do nosso correspondente Rami Abou Jamous. Tinha 18 anos.

Se existe nessa vontade de Netanyahu de participar de uma guerra sem fim uma dimensão pessoal — o medo do julgamento por seus processos por corrupção e de uma comissão de investigação sobre suas responsabilidades pessoais no fracasso de 7 de outubro de 2023 —, seria um erro limitar-se a essa leitura. Ele não pretende fazer surgir um Oriente Médio democrático como sonhavam os neoconservadores americanos, mas sim semear o caos para evitar o surgimento de qualquer Estado ou força estruturada que possa resistir no entorno de Israel.

Seu comportamento na Síria é significativo. Tel Aviv aproveitou a queda do regime de Bashar al-Assad não apenas para ampliar o território que já ocupa ilegalmente no Golã, mas para avivar tensões internas bombardeando regularmente o território, tentando estabelecer relações com as “minorias”, sejam drusas ou alauítas, para impedir a reconstituição de um Estado sírio estável. Assim, volta a uma velha estratégia de aliança de “minorias” que sempre ditou, ao menos em parte, a política israelense, especialmente no Líbano durante a guerra civil (1975–1989), por meio da aliança com grupos maronitas. Tem um objetivo claro que Michael Young, editor-chefe do blog Diwan, explica em artigo publicado pelo L’Orient-Le-Jour em 16 de janeiro de 2025:

“Para os israelenses, a fragmentação da Síria e dos países árabes vizinhos seria uma bênção. Esse resultado não só garantiria a fraqueza dos vizinhos de Israel, mas também significaria, no caso da Síria, que não há governo crível para contestar a anexação ilegal dos Montes Golã. Estados árabes enfraquecidos também abrem outras portas, em particular a que permite a Israel proceder a uma limpeza étnica da população palestina, empurrando-a para os países vizinhos, sem encontrar muita resistência. Essas seriam as vantagens de uma partição do país segundo linhas etno-confessionais, que permitiriam aos israelenses estabelecer zonas tampão próximas às suas próprias fronteiras, ou zonas de influência em outros lugares.”

Um Oriente Médio caótico e dividido, sobre o qual reinará um Estado abertamente livre do direito internacional — essa é a promessa de Israel, cujos aliados ocidentais garantem os meios para implementá-la.

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