
Negacionismo científico: 5 coisas que você pode fazer sobre isso
Questões centrais para questionar e combater o negacionismo científico impulsionado pela extrema direita
A negação da ciência se tornou letal em 2020. Muitos líderes políticos falharam em apoiar medidas de prevenção que os cientistas sabiam ser eficazes. Ao longo da pandemia, pessoas morreram de COVID-19 ainda acreditando que o vírus não existia.
A negação da ciência não é novidade, claro. Mas é mais importante do que nunca entender por que algumas pessoas negam, duvidam ou resistem a explicações científicas – e o que pode ser feito para superar essas barreiras à aceitação da ciência.
Em nosso livro “Science Denial: Why It Happens and What to Do About It” (“Negação da Ciência: Por que acontece e o que fazer a respeito”), oferecemos maneiras de entender e combater o problema. Como dois psicólogos pesquisadores, sabemos que todos são suscetíveis a formas de negação da ciência. O mais importante é que sabemos que existem soluções.
Aqui estão nossos conselhos sobre como enfrentar cinco desafios psicológicos que podem levar à negação da ciência:
Desafio #1: Identidade social
As pessoas são seres sociais e tendem a se alinhar com aqueles que compartilham crenças e valores semelhantes. As redes sociais amplificam essas alianças. É mais provável que você veja conteúdos com os quais já concorda e menos pontos de vista alternativos. As pessoas vivem em bolhas informacionais criadas por algoritmos poderosos. Quando alguém do seu círculo social compartilha desinformação, você tem mais chance de acreditar e repassar. A desinformação se multiplica, e a negação da ciência cresce.
Ação #1: Cada pessoa tem múltiplas identidades sociais. Um de nós conversou com um negador das mudanças climáticas e descobriu que ele também era avô. Ele se abriu ao pensar no futuro dos netos, e a conversa se voltou para preocupações econômicas — a raiz da sua negação. Ou talvez alguém hesite em se vacinar porque outras mães no grupo de brincadeiras do filho também hesitam, mas ela também é uma pessoa cuidadosa, preocupada com crianças imunocomprometidas.
Temos constatado que ouvir as preocupações dos outros e tentar encontrar um terreno comum é eficaz. Alguém com quem você se conecta é mais persuasivo do que alguém com quem você tem pouco em comum. Quando uma identidade bloqueia a aceitação da ciência, ative outra identidade para estabelecer uma conexão.
Desafio #2: Atalhos mentais
Todos estão ocupados, e seria exaustivo pensar profundamente o tempo todo. Você vê um artigo com um título sensacional como “Coma chocolate e viva mais” e compartilha porque assume que é verdade, quer que seja, ou acha engraçado.
Ação #2: Em vez de compartilhar aquele artigo dizendo que organismos geneticamente modificados fazem mal, aprenda a desacelerar e monitorar respostas intuitivas rápidas — o que o psicólogo Daniel Kahneman chama de Sistema 1. Acione o modo racional e analítico do Sistema 2 e pergunte: como eu sei que isso é verdade? Isso é plausível? Por que acredito nisso? Depois, verifique os fatos. Aprenda a não aceitar imediatamente informações nas quais você já acredita — isso é viés de confirmação.
Desafio #3: Crenças sobre o que é conhecimento
Todos têm ideias sobre o que é conhecimento, de onde vem e em quem confiar. Algumas pessoas pensam de forma dualista: sempre há um certo e um errado claros. Já os cientistas veem a incerteza como parte fundamental de sua disciplina. Algumas pessoas podem não entender que afirmações científicas mudam conforme mais evidências surgem, e por isso podem desconfiar das mudanças nas políticas de saúde pública em relação à COVID-19.
Jornalistas que apresentam “os dois lados” de consensos científicos estabelecidos podem, sem querer, fazer parecer que a ciência é mais incerta do que realmente é. Apenas 57% dos americanos acreditam que a mudança climática é causada por atividades humanas, comparado a 97% dos cientistas climáticos. E só 55% acham que os cientistas têm certeza de que isso está acontecendo.
Ação #3: Reconheça que outras pessoas (ou até você) podem estar operando com crenças equivocadas sobre a ciência. Você pode ajudar os outros a adotar o que o filósofo da ciência Lee McIntyre chama de atitude científica — estar aberto a novas evidências e disposto a mudar de ideia.
Poucas pessoas confiam em apenas uma fonte de conhecimento. A hesitação vacinal, por exemplo, foi combatida com sucesso por médicos que desmentiram crenças erradas e por amigos que explicaram por que mudaram de opinião. Líderes religiosos também têm se posicionado, e alguns abriram lugares de culto como centros de vacinação.
Desafio #4: Raciocínio motivado
Talvez você não ache que suas opiniões políticas influenciem como interpreta um gráfico simples. Mas, quando as pessoas veem o mesmo gráfico mostrando aumento do custo de moradia ou do dióxido de carbono, as interpretações variam conforme a filiação política. Conservadores tendem a interpretar mal o gráfico sobre CO₂ mais do que o sobre moradia. Quando as pessoas raciocinam não apenas com base nos fatos, mas com um viés inconsciente para chegar à conclusão preferida, o raciocínio se distorce.
Ação #4: Talvez você pense que comer alimentos geneticamente modificados faz mal, mas já examinou as evidências? Leia artigos com informações pró e contra, avalie a fonte e esteja aberto ao que os dados indicam. Se você se der tempo para refletir, pode evitar o raciocínio motivado e se abrir para novas informações.
Desafio #5: Emoções e atitudes
Quando Plutão foi rebaixado a planeta-anão, muitas crianças (e alguns adultos) reagiram com raiva e oposição. Emoções e atitudes estão ligadas. Reações ao ouvir que os humanos influenciam o clima podem variar de raiva (se você não acredita), frustração (se teme ter que mudar hábitos) a ansiedade e desesperança (se acredita que já é tarde demais para resolver). Como você se sente sobre mitigações climáticas ou rotulagem de OGMs reflete se é a favor ou contra essas políticas.
Ação #5: Reconheça o papel das emoções nas decisões sobre ciência. Se você reage fortemente a uma notícia sobre uso de células-tronco em tratamentos para Parkinson, pergunte se está sendo excessivamente otimista por causa de um parente com a doença. Ou será que está rejeitando um tratamento potencialmente salvador por razões emocionais?
Sentimentos não devem (e não podem) ser separados de como você pensa sobre ciência. Em vez disso, é importante entender que emoções são formas integradas de pensar e aprender sobre ciência. Pergunte a si mesmo se sua atitude frente a um tema científico se baseia em emoções e, em caso afirmativo, dê um tempo para refletir e também sentir sobre o assunto.