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A luta contra Belo Monte, ontem e hoje
Antifascismo

A luta contra Belo Monte, ontem e hoje

A luta contra a hidrelétrica se tornou um dos principais símbolos da resistência ambiental e indígena no Brasil.

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Via Brasil Real é um País que Luta

Tempo de leitura: 7 minutos.

A construção da Usina Hidroelétrica de Belo Monte, localizada no Rio Xingu, no estado do Pará, se tornou um dos principais símbolos da resistência ambiental e indígena no Brasil. Desde sua concepção, o projeto gerou intensos conflitos, colocando em confronto os interesses do governo, das grandes empreiteiras e dos povos indígenas, além de organizações ambientalistas e da comunidade científica. A luta contra Belo Monte é marcada por uma série de episódios que expõem as contradições do chamado projeto desenvolvimentista reivindicado por setores da esquerda, que passa pela aposta no desenvolvimento capitalista alicerçado na lógica produtivista que ameaça a natureza e a humanidade.

A resistência à construção de Belo Monte se deu em razão de diversos fatores, como a devastação ambiental que a obra provocou. O projeto, responsável por uma das maiores hidrelétricas do mundo, inundou uma vasta área da floresta amazônica, afetando a biodiversidade local e desestabilizando ecossistemas já fragilizados. A construção da usina causou a destruição de milhares de hectares de floresta, impactando diversas espécies ameaçadas de extinção e comprometendo o equilíbrio ecológico da região. Além disso, a obra provocou uma alteração significativa do regime hídrico do Rio Xingu, o que afetou não apenas a flora e fauna locais, mas também as comunidades que dependem diretamente desse rio para sua sobrevivência.

A violação dos direitos dos povos indígenas, profundamente afetados pela construção de Belo Monte, ignorados pelo projeto de “desenvolvimento” que atropela todas as formas de vida marginais à dinâmica capitalista, atravessou todo o processo; a Constituição de 1988 assegura aos indígenas o direito à consulta prévia sobre projetos que afetem suas terras e modos de vida, um direito frequentemente ignorado no processo de licenciamento da usina. As comunidades indígenas do Xingu, como os Kaiapós, os Araras e os Jurunas, tiveram em Belo Monte uma ameaça direta à sua cultura e à sua existência. Essa ameaça gerou revolta e levou os povos indígenas a se organizarem na luta contra a construção da usina.

A construção de Belo Monte se insere em um contexto de opções econômicas e políticas. A hidrelétrica fez parte do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) do governo brasileiro, que priorizou a construção de grandes obras de infraestrutura, como a usina, para atender aos interesses de grandes empresas do setor energético, que buscam maximizar lucros à custa da degradação ambiental e dos direitos dos povos originários.

Desde o início do projeto, diversos episódios marcaram a luta contra a Usina de Belo Monte. Um dos momentos mais significativos ocorreu em 1989, quando foi realizado o 1º Encontro dos Povos Indígenas do Xingu em Altamira, que reuniu milhares de pessoas, incluindo líderes indígenas de várias etnias. O encontro ganhou destaque na mídia nacional e internacional, levando à formação de um movimento contra a construção da hidrelétrica.

Em 2008, outro marco importante foi o Encontro Xingu Vivo para Sempre, que novamente mobilizou indígenas e ribeirinhos em um grande ato de resistência. Durante o evento, houve confrontos entre manifestantes e representantes do governo Lula, impulsionador da construção de Belo Monte. Após o encontro, foi divulgada a Carta Xingu Vivo para Sempre, que denunciava os impactos da usina e exigia um desenvolvimento sustentável para a região. Esse documento tornou-se uma referência para a luta, articulando as reivindicações das comunidades afetadas e propondo alternativas que respeitassem o meio ambiente e os direitos dos povos indígenas.

Além dos encontros, ações diretas também foram realizadas. Em diversas ocasiões, indígenas ocuparam o canteiro de obras da usina, protestando contra a continuidade do projeto. Essas ocupações foram acompanhadas de repressão por parte das forças de segurança, acirrando o conflito entre os povos originários e os interesses do Estado e das corporações. As ações dos povos indígenas e de seus apoiadores foram fundamentais para chamar a atenção do Brasil e do mundo para tudo aquilo que seria destruído e afogado em nome do “desenvolvimento”.

A luta contra Belo Monte não se restringiu ao Pará. Organizações ambientais, movimentos sociais e ativistas de todo o Brasil e do mundo uniram forças para denunciar os abusos cometidos no processo de construção da usina. As denúncias de violação de direitos humanos, desmatamento e corrupção trouxeram visibilidade ao conflito e ampliaram a pressão sobre o governo. A repercussão internacional foi significativa, com diversos documentos e cartas sendo enviados a organismos internacionais, como a Organização das Nações Unidas (ONU), solicitando apoio e atenção para a situação crítica enfrentada pelos povos do Xingu.

A resistência à construção da Usina Hidrelétrica de Belo Monte é um exemplo emblemático de uma disputa pelo futuro que segue em aberto. A crise climática, fratura exposta da crise do capitalismo, nos coloca em uma encruzilhada histórica que ditará não mais qual futuro, mas a própria possibilidade de futuro para a humanidade. A lógica capitalista de acumulação e produção infinita, que ameaça a forma de vida dos povos originários e com ela a própria natureza, objetificada para a exploração, não nos oferece futuro possível. Não há desenvolvimento possível na lógica capitalista que dê conta da emergência climática e que não tenha como alicerce a destruição dos direitos, o arrocho salarial, o desemprego e o aprofundamento das desigualdades.

Avança a exploração sobre o trabalho e com ela a exploração sobre a natureza, e, assim como a crise climática evidencia o esgotamento do planeta, acende o alerta sobre a urgência de superar o próprio sistema capitalista e sua lógica. Desde já, é preciso se apoiar na luta dos povos indígenas, dos pequenos agricultores e dos sem-terra para enfrentar o grande agronegócio, o garimpo e a devastação predatória. Em tempos de desastres como as enchentes no Rio Grande do Sul, as queimadas criminosas país afora e a degradação das condições de sobrevivência, não são as alianças com o capital financeiro, com os latifundiários e as grandes indústrias, materializadas no maior Plano Safra da história, que cede mais de 400 bilhões em créditos ao agro no biênio 2024/2025, um caminho imediato, muito menos estratégico, de resposta à crise multifatorial do capitalismo.

A disputa pelo futuro segue aberta; a luta contra Belo Monte segue pulsando na resistência daqueles que lutam contra a exploração e em defesa de suas vidas. São nesses processos de luta onde se encontram as bases para a construção de uma alternativa real, anticapitalista e ecossocialista. Mude o sistema, não o clima!

Saiba Mais

BERMANN, Célio. O projeto da Usina Hidrelétrica Belo Monte: a autocracia energética como paradigma. Novos Cadernos NAEA, v. 15, n. 1, 2012.

FLEURY, Lorena Cândido; ALMEIDA, Jalcione. A construção da Usina Hidrelétrica de Belo Monte: conflito ambiental e o dilema do desenvolvimento. Ambiente & Sociedade, v. 16, p. 141-156, 2013.

ARAUJO, Mayara Moreno Vasconcelos; PINTO, K. J.; MENDES, F. O. A Usina de Belo Monte e os impactos nas terras indígenas. Planeta Amazônia, v. 4, p. 43-51, 2014.

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