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A revoada dos galinhas verdes: antifacismo no Brasil na década de 30
História

A revoada dos galinhas verdes: antifacismo no Brasil na década de 30

A histórica batalha de rua contra os integralistas em São Paulo uniu todas as forças democráticas dos anos 1930

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Via Brasil Real é um País que Luta

Tempo de leitura: 5 minutos.

A crise econômica do liberalismo, desencadeada pela quebra da bolsa de Nova Iorque em 1929 deixou marcas profundas a nível internacional, exacerbando as desigualdades e fomentando um terreno propício para o radicalização política. Além das elites econômicas e políticas, as massas trabalhadoras e setores médios buscavam por alternativas políticas tanto pela direita quanto pela esquerda. Nesse contexto, o integralismo, mosvimento brasileiro de inspiração fascista, emergiu como uma resposta radical à instabilidade política e econômica, prometendo ordem e nacionalismo como solução para as mazelas do país. Os integralistas disputavam o conjunto da sociedade com seu discurso de união nacional e anticomunismo. Por outro lado, também as organizações de esquerda acumulavam forças, refletindo a revolta dos trabalhadores frente à crise do capitalismo e a resistência ao avanço do fascismo.

Foram várias as frentes antifascistas construídas pelas organizações políticas e o movimento sindical, com destaque para a Frente Única Antifascista (FUA), impulsionada pelos trotskistas da Liga Comunista e pelos militantes paulistas do Partido Socialista Brasileiro; o Comitê Antiguerreiro, construído pelo Partido Comunista do Brasil (PCB); e o Comitê Antifascista dirigido pelos anarquistas da Federação Operária de São Paulo (FOSP). A organização dos trabalhadores e as diversas tentantivas, notadamente, em sua maioria, dos trotskistas que construíam a FUA, em avançar na construção de uma frente única antifacista nacional e uma frente única no movimento sindical, foi fundamental para o combate ao integralismo na disputa do movimento de massas, apostando em um enfrentamento à quente, baseado na organização do conjunto dos trabalhadores que conectava a tarefa de frear a reação com a construção estratégica de uma alternativa de massas independente e anticapitalista, impulsionando também um movimento contra as políticas repressivas do governo Vargas.

Desde 1993, foram vários os episódios de confronto entre integralistas e antifacistas, sendo um dos primeiros registros a tentativa dos integralistas, repelida pelos trabalhadores, de tumultuar uma Conferência Anti-integralista realizada no salão da União das Classes Laboriosas que reuniu cerca de mil pessoas no dia 14 de novembro daquele ano. As denúncias de violência por parte dos integralistas contra trabalhadores e militantes das organizações de esquerda aumentavam na medida em que o integralismo acumulava forças e fazia demonstrações públicas organizando atos e passeatas, quase sempre confrontadas pelas frentes antifascistas que corajosamente organizavam comícios e contramanifestações para desarticular e fazer o enfrentamento aos fascistas. O acirramento dos conflitos culminou, em 1934, no coração de São Paulo, na Batalha da Sé, um dos episódios mais marcantes da luta política no Brasil, onde os trabalhadores antifascistas, trotskistas, comunistas, socialistas e anarquistas se enfrentaram com os integralistas e impediram a realização do comício organizado pela Ação Integralista Brasileira, em razão dos 2 anos da publicação do Manifesto Integralista.

Os antifascistas, previamente organizados e armados, dirigiram-se para a Praça da Sé onde confrontaram os integralistas aos gritos de “fora galinhas verdes”, como eram conhecidos os membros da AIB, caracterizados pelo uso das camisas verdes. Um primeiro confronto ocorreu, depois das 14h, e foi dispersado pelas armas das forças policias. Cerca de dez minutos depois, os integralistas se reagruparam nas escadarias da catedral e eram confrontados pelas palavras de ordem antifascistas; após os disparos de uma metralhadora que matou um guarda civil, segundo o jornal A Plebe, se desencadeou o confronto armado. Até às 17h daquele dia ainda haviam focos de confronto, nos quais parte dos soldados da força pública se somaram aos antifacistas contra os integralistas. Ao fim, os “galinhas verdes” abandonaram o centro da cidade deixando para trás suas camisas verdes.

O embate na Batalha da Sé não foi apenas físico, mas politicamente simbólico. Foi um dos episódios de  demonstração de forças e organização dos trabalhadores frente ao avanço do movimento fascista que ameaçava não apenas as liberdades individuais, mas também a organização operária, os direitos e a luta em sua defesa. Mais do que um episódio de confronto, expressou parte dos esforços pelo fortalecimento do movimento operário, na construção da unidade de ação dos trabalhadores, preparando terreno para uma estratégia ruptura que apontasse uma saída pela esquerda para a crise.

Hoje, o fortalecimento da extrema-direita no Brasil e no mundo impõe a necessidade da construção de um programa que combine a tarefa da defesa das liberdades democráticas, dos direitos das trabalhadoras e trabalhadores, das mulheres, da juventude, da negritude e das LGBTQIA+, sem vacilar no enfrentamento ao neofacismo, com a tarefa da construçaõ de uma alternativa anticapitalista de massas, enraizada na dinâmica das lutas populares e na unidade da classe ao redor de suas demandas concretas, imediatas e transitórias. O exemplo que nos dão os antifascistas que combateram o integralismo na década de 30 e o movimento operário em todo o mundo, da luta pela construção da unidade de luta dos trabalhadores como alicerce de uma saída pela esquerda segue sendo fundamental para os desafios que enfrentamos hoje. A derrota da extrema-direita nas eleições legislativas da França é exemplo de que abaixar nossas bandeiras está longe de ser a alternativa mais eficaz para barrar o retrocesso. 

Fontes

https://pt.wikipedia.org/wiki/Batalha_da_Pra%C3%A7a_da_S%C3%A9#cite_note-FOOTNOTERodrigues201795-8

https://jacobin.com.br/2021/10/um-fascista-nao-corre-voa/

CASTRO, R. F. DE .. A Frente Única Antifascista (FUA) e o antifascismo no Brasil (1933-1934). Topoi (Rio de Janeiro), v. 3, n. 5, p. 354–388, jul. 2002.

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