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Como a desinformação climática “sofisticada” chega ao centro do poder
Negacionismo

Como a desinformação climática “sofisticada” chega ao centro do poder

A indústria de combustíveis fósseis e populistas de direita estão cada vez mais mirando formuladores de políticas por meio de canais paralelos, segundo um novo relatório

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Via Climate Change News

Tempo de leitura: 4 minutos.

Campanhas de desinformação climática promovidas por empresas de combustíveis fósseis e grupos populistas de direita se tornaram mais sofisticadas e capazes de influenciar a formulação de políticas por meio de “canais paralelos”, segundo os autores de um novo e importante relatório.

Baseado na análise de mais de 300 artigos científicos, o estudo do Painel Internacional sobre o Ambiente da Informação (IPIE) concluiu que a disseminação de informações falsas e enganosas deixou de negar a existência das mudanças climáticas para semear dúvidas sobre suas causas e soluções.

“O ceticismo estratégico tem substituído o negacionismo climático básico”, disse o professor Klaus Bruhn Jensen, presidente do painel científico do IPIE sobre integridade da informação relacionada à ciência do clima.

“Muita da informação está mais confusa. Não se trata de uma negação direta das mudanças climáticas, mas sim de algo mais sofisticado”, acrescentou. “Sugere-se às pessoas: ‘Bem, isso é realmente culpa de determinados emissores? As soluções propostas por acadêmicos e formuladores de políticas realmente funcionam?’.”

O objetivo é minar a confiança, retardar as respostas às mudanças climáticas e dificultar intervenções políticas e econômicas, como a transição dos combustíveis fósseis para a energia limpa, afirma o relatório.

Para isso, a desinformação está cada vez mais voltada para líderes políticos, funcionários públicos e outros agentes com poder de transformar a ciência climática em ações concretas.

Enquanto o público em geral tende a encontrar informações distorcidas na mídia tradicional ou nas redes sociais, os formuladores de políticas são principalmente visados por canais que operam “abaixo do radar”, explicam os autores do relatório.

Esses canais incluem relatórios de sustentabilidade corporativa que retratam de forma enganosa indústrias poluentes, campanhas de relações públicas com greenwashing, relatórios partidários elaborados por grupos de lobby ou think tanks, e relações pessoais entre líderes empresariais e políticos.

“É uma espécie de canal paralelo para ganhar influência tanto nos círculos políticos quanto no debate público”, afirmou Jensen.

Como exemplo, o relatório cita um estudo com base em 725 relatórios de sustentabilidade corporativa que revelou uma grande divergência entre o que as empresas dizem e o que realmente fazem, incluindo afirmações exageradas sobre seu impacto ambiental positivo.

Também destacou o uso de petições e documentos legais por parte de empresas de combustíveis fósseis e outros poluidores envolvidos em processos judiciais relacionados ao clima, usados para difundir narrativas que minimizam sua responsabilidade na crise climática e adiam ações concretas.

Crescente influência dos think tanks
Ece Elbeyi, uma das autoras do relatório, destacou como os disseminadores de desinformação operam cada vez mais por meio de um sistema interconectado que entrega mensagens-chave a formuladores de políticas.

“Os think tanks tornaram-se especialmente importantes porque servem de ponte entre atores relevantes como partidos políticos, legisladores e setores econômicos como as empresas de combustíveis fósseis”, afirmou.

Nos Estados Unidos, think tanks conservadores como o Heartland Institute e a Heritage Foundation promovem visões negacionistas do clima e exercem influência sobre o Partido Republicano liderado pelo presidente Donald Trump.

A Heritage Foundation coordenou o chamado “Projeto 2025”, o controverso plano de 900 páginas para reestruturar o governo federal. Entre outras medidas, ele propunha o fim do que chamou de “fanatismo climático” e a redução do financiamento dos EUA para ações climáticas dentro e fora do país.

Desde que voltou à Casa Branca em janeiro passado, a administração Trump afastou os EUA da política climática internacional, desmantelou a USAID – agência de ajuda internacional usada como canal chave para financiamento climático global – e propôs cortes no orçamento doméstico destinado à redução de emissões.

Apesar do cenário desanimador, o relatório do IPIE oferece algumas sugestões para combater a desinformação climática.

Recomenda-se a introdução de leis que exijam a produção de informações climáticas precisas e consistentes, além de relatórios padronizados sobre pegadas de carbono por parte de empresas privadas e instituições públicas.

“Coalizões de dispostos” devem ser formadas para enfrentar as alianças de interesses poderosos, enquanto a educação deve aprofundar a alfabetização científica e midiática de cidadãos e formuladores de políticas, conclui o relatório.

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