Por Projeto Brasil Real é um País que Luta
Via Brasil Real é um País que Luta
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A luta das LGBTQIA+ no Brasil tem uma história multifacetada, com marcos que refletem as batalhas enfrentadas em todo o mundo. Um dos episódios marcantes dessa história foi a revolta do Ferro’s Bar, conhecida como a “Stonewall brasileira”, que se tornou um símbolo da resistência lésbica dentro da comunidade LGBTQIA+ contra a opressão e a discriminação machista.
Nos anos 1980, o Brasil vivia um período de intensas transformações políticas e sociais. O país estava em transição da ditadura militar para o regime democrático e os movimentos sociais emergiam com intensidade na luta por direitos. Foi nesse contexto que a comunidade LGBTQIA+ avançou em sua organização e mobilização, enfrentando o conservadorismo e a repressão sexual.
Localizado em São Paulo, o Ferro’s Bar era um ponto de encontro das LGBTQIA+. Os bares e clubes eram alguns dos poucos espaços onde a comunidade se reunia com liberdade para expressar suas identidades e vivências, tornando-se assim espaços de resistência e organização das lutas contra a opressão. O episódio que teve como palco aquele bar que reunia estudantes e artistas de esquerda, se tornou marco para a criação do dia do orgulho lésbico.
Em 19 de agosto de 1983, o Ferro’s Bar foi tomado por uma revolta protagonizada pelas mulheres do GALF, Grupo de Ação Lésbica Feminista, após serem proibidas pelo dono do estabelecimento de distribuir o boletim Chanacomchana, uma iniciativa do grupo articulada com o jornal Lampião da Esquina, primeiro editorial feito por e para pessoas LGBTQIA+ no Brasil, sob a acusação de ferir a moral e os bons costumes. Naquele dia, lideradas por figuras como Rosely Roth, as mulheres lésbicas ocuparam o bar e protestaram contra a censura do boletim.
A ocupação do Ferro’s Bar foi um catalisador para a organização e visibilidade das lésbicas no Brasil. O episódio recebeu a solidariedade do movimento feminista e mesmo de alguns parlamentares. Foi por sua importância que ficou conhecido como a “Stonewall brasileira”. Essa mobilização impulsionou organizações, como o GALF, protagonizadas por mulheres lésbicas. O GALF organizava reuniões, manifestações e produzia materiais que debatiam as lutas em defesa dos direitos a partir da realidade das mulheres lésbicas, marcada por uma dupla opressão: a homofobia e o machismo. Enfrentando a perseguição e o apagamento tanto fora quanto dentro da comunidade LGBTQIA+, as lésbicas lutaram por visibilidade e reconhecimento em um movimento majoritariamente hegemonizado pelos homens gays.
Além de batalharem contra o apagamento dentro das organizações da comunidade LGBTQIA+, as mulheres lésbicas também tiveram que lutar pela inclusão em espaços feministas, onde frequentemente eram marginalizadas. A intersecção das lutas, necessária pela realidade de marginalização imposta pela articulação das opressões que recaíam com mais peso sobre as lésbicas, foi uma contribuição fundamental da mobilização desses grupos para o movimento LGBTQIA+, que não pode se furtar aos debates de raça, gênero e classe para compreender a totalidade.
É, também, a revolta do Ferro’s Bar um episódio da potência da luta de um setor marginalizado mesmo entre os “dissidentes” que, ao se rebelar pela liberdade de expressão dentro de um bar, expressou disposição de luta e protagonizou outros momentos importantes na luta políticos em defesa da democracia no país, denunciando a perseguição, a censura e a tortura promovidas pela ditadura militar. É fundamental resgatar, diante da resistência de setores conservadores da esquerda brasileira, o papel fundamental que ocuparam em nossa história as lutas democráticas protagonizadas pelas LGBTQIA+ como um guia para a ação no presente, compreendendo a potencialidade da luta para enfrentar a extrema-direita e construir alternativas daqueles que são atravessados pela exploração de maneira ainda mais violenta pelas opressões articuladas pelo sistema capitalista.
Fontes:
http://outrosurbanismos.fau.usp.br/lugares-memoria-lgbt-sao-paulo/ferros-bar/