Partido conservador francês se divide por flerte com a extrema direita
O futuro do Les Républicains está em jogo, à medida que deserções de figuras de destaque e as discussões sobre uma “coalizão da boa vontade” com a extrema direita provocam turbulência antes das eleições municipais da próxima primavera
O partido de centro-direita francês Les Républicains (LR) caminha para uma implosão, à medida que seis membros aceitaram cargos no governo Lecornu contra as instruções da direção partidária, enquanto crescentes apelos por uma aliança com a extrema direita aprofundam as fraturas internas.
A mais recente turbulência começou quando o presidente do Rassemblement National (RN), Jordan Bardella, declarou na semana passada que “para vencer, precisamos nos unir”, sinalizando disposição em se aproximar de parlamentares do Les Républicains em caso de eleições legislativas antecipadas, a fim de formar um “acordo de governo”.
Suas declarações reacenderam o debate sobre uma possível união das direitas, inspirada na coalizão liderada por Giorgia Meloni na Itália.
O presidente do LR, Bruno Retailleau, rejeitou formalmente a oferta, citando diferenças em relação à política econômica. No entanto, sua retórica cada vez mais dura sobre imigração e segurança tem alimentado especulações de que uma reaproximação com o partido de extrema direita já não é mais um tabu.
A senadora do LR Sophie Primat afirmou na semana passada que um “contrato de governo” com o RN “não é totalmente impossível”.
Fraturas dentro do LR se aprofundam
Após a defecção do ex-líder Éric Ciotti para o campo de Marine Le Pen durante as eleições legislativas de 2024, a nomeação de Michel Barnier como primeiro-ministro e a entrada de Retailleau no governo pareciam, por um breve momento, dar novo fôlego ao partido.
Mas a decisão de Retailleau de derrubar o primeiro governo Lecornu reabriu fissuras profundas — entre os que defendem a cooperação com o bloco centrista do presidente Emmanuel Macron e os que advogam uma aproximação com a extrema direita.
“Não compartilho da posição de Retailleau”, disse o deputado Sébastien Martin ao Euractiv na semana passada, depois que o líder do LR conclamou os eleitores a bloquear um candidato socialista em uma eleição suplementar em Tarn-et-Garonne — postura que, implicitamente, significava apoiar o candidato da extrema direita.
“Eu pertenço à direita gaullista, que sempre se opôs a Le Pen”, acrescentou.
Martin foi desde então expulso do partido por ter aceitado o cargo de ministro da Indústria no segundo gabinete Lecornu.
Outros cinco membros do LR tiveram o mesmo destino — entre eles a ministra da Cultura Rachida Dati, candidata designada do partido à prefeitura de Paris, e a ministra da Agricultura Annie Genevard, que também preside o importante comitê de indicações para as eleições municipais da próxima primavera.
Agora de volta à oposição, Retailleau acusou o governo de estar “refém dos socialistas” após o engavetamento da reforma da Previdência, e condenou seu “silêncio sobre imigração”.
Sua posição não está longe da de Ciotti, que imediatamente propôs abrir negociações para construir uma nova aliança de direita com o RN.
“Coalizão da boa vontade”
A tentativa de unir a direita liberal e a extrema direita populista remonta à ascensão da Frente Nacional de Jean-Marie Le Pen nas eleições europeias de 1984. No entanto, a questão ainda divide o próprio RN.
Diferentemente de Bardella, Marine Le Pen defende uma “união nacional” mais ampla, que vá além da direita, vendo-a como essencial para vencer a eleição presidencial de 2027. Ainda assim, ela não descarta incluir parlamentares individuais do LR em uma “missão de governo” caso o RN não conquiste maioria absoluta.
“Não gosto do termo ‘união das direitas’; prefiro ‘coalizão da boa vontade’”, declarou o porta-voz do RN, Laurent Jacobelli, ao Euractiv. “Mas é claro que alguns deputados do LR concordam com 90% do que propomos — e prefeririam muito mais nos apoiar do que a um governo de esquerda.”
Ao garantir um acordo de não censura com o Partido Socialista na terça-feira, Lecornu adiou por enquanto o espectro de uma nova dissolução.
Mas, com as negociações orçamentárias se aproximando e as eleições municipais na primavera, o futuro do histórico partido conservador francês está em jogo — e a possibilidade de um bloco direitista há muito discutido deve em breve se testar nas urnas.
