Pular para o conteúdo
A Luta dos Posseiros de Trombas e Formoso
Antifascismo

A Luta dos Posseiros de Trombas e Formoso

A resistência camponesa aconteceu no norte de Goiás nas décadas de 1950 e 1960

Por

Via Brasil Real é um País que Luta

Tempo de leitura: 5 minutos.

A luta dos posseiros de Trombas e Formoso, ocorrida nas regiões rurais do norte de Goiás nas décadas de 1950 e 1960, é um marco histórico da resistência camponesa no Brasil.  

A ocupação das terras de Trombas e Formoso teve início no final dos anos 1940. Camponeses migrantes, principalmente do Nordeste e de outras áreas do Centro-Oeste, foram atraídos por promessas de terras devolutas que poderiam ser cultivadas. Essas famílias se estabeleceram em lotes de terra que variavam entre 30 e 200 hectares, com a esperança de construir uma vida independente da exploração latifundiária e dos arrendamentos. 

Entretanto, a região atraía também a atenção de fazendeiros e grileiros que reivindicavam a posse dessas terras. A existência de extensas áreas sem titulação formal tornou-se o estopim para conflitos entre posseiros, que ocupavam e cultivavam as terras, e grandes proprietários que buscavam consolidar seu domínio sobre essas regiões. 

Diante das tentativas de expulsão e da violência promovida por jagunços a serviço dos grileiros, os posseiros se organizaram em estruturas comunitárias de autodefesa. Lideranças como José Porfírio de Souza emergiram como figuras centrais na articulação do movimento. José Porfírio, um agricultor que chegaria à Câmara como deputado federal, ajudou a organizar os posseiros em conselhos comunitários, estabelecendo mecanismos de resistência coletiva. 

Essas estruturas de auto-organização não apenas defendiam os territórios ocupados, mas também disputavam uma governança local. Comitês foram estabelecidos para resolver disputas, planejar estratégias de defesa e negociar com as autoridades. A organização dos posseiros de Trombas e Formoso é frequentemente citada como um exemplo pioneiro de resistência agrária no Brasil. 

A resistência dos posseiros culminou em diversas vitórias significativas, ainda que parciais. Em 1961, após anos de conflitos, o governo de Goiás, então liderado por Mauro Borges, interveio no conflito e, pressionado pela organização e mobilização dos posseiros, começou a regularizar as terras ocupadas pelos camponeses. Cerca de 20 mil títulos de posse foram concedidos, consolidando a presença de muitas famílias na região. 

A vitória foi resultado da organização dos trabalhadores do campo e da pressão exercida pelas forças progressistas, contando com a solidariedade do conjunto da classe trabalhadora e de suas organizações, como os sindicatos e partidos políticos que reivindicavam a causa dos camponeses. Entretanto, enquanto espelho dos árduos conflitos agrários que permeiam a história do Brasil, a situação permaneceu instável, com novas tentativas de expulsão e confrontos entre posseiros e latifundiários. 

O golpe militar de 1964 e as mudanças drásticas operadas no cenário político brasileiro, impactaram diretamente os movimentos sociais e rurais. A ditadura via nas organizações camponesas uma ameaça à ordem estabelecida e aos interesses do grande agronegócio e seus planos de expansão e “integração” do campo, executados às custas da violência contra os pequenos camponeses e povos originários, e implementou uma política de repressão severa contra esses grupos. A ditadura militar revogou os títulos das posses conquistadas pela luta dos posseiros. 

Em Trombas e Formoso, o novo regime dissolveu as organizações comunitárias e reprimiu violentamente os posseiros. José Porfírio teve seu mandato cassado, foi perseguido e preso. A militarização da região levou à fragmentação das estruturas de resistência, enfraquecendo o movimento camponês. 

A repressão também teve consequências sociais profundas. Muitas famílias foram deslocadas, enquanto outras permaneceram em situações de vulnerabilidade, enfrentando violência e pobreza. A perda de lideranças e a desarticulação das organizações camponesas comprometeram as conquistas obtidas até então. 

Apesar das perdas, a luta dos posseiros de Trombas e Formoso deixou um legado duradouro na história das mobilizações sociais no Brasil. O movimento serviu como inspiração para organizações posteriores, como as Ligas Camponesas e, mais tarde, o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST). 

O exemplo da resistência dos posseiros do norte de Goiás deixou um legado importante para a organização coletiva nas lutas do campo em defesa do direito à terra, diante de um sistema fundiário profundamente desigual e de um Estado alinhado aos interesses do latifúndio. Trombas e Formoso continuam a ser lembrados como símbolos de luta e inspiração para todos aqueles que lutam pelo fim da concentração de terras e pela reforma agrária popular no Brasil. 

Hoje, diante da encruzilhada histórica em que nos encontramos, de uma crise profunda do sistema capitalista, expressa no colapso climático, na fome e na retirada de direitos, enquanto do outro lado concentram-se cada vez mais as riquezas e a terra, o exemplo de organização dos trabalhadores de Trombas e Formoso na luta em defesa de seu território, contra a violência do latifúndio e na criação de organismos de luta é uma bússola que deve orientar nosso horizonte. 

https://trombaseformoso.cidarq.ufg.br/p/11836-linha-do-tempo#:~:text=5%2D%20Batalha%20da%20Tata%C3%ADra,as%20mulheres%2C%20velhos%20e%20crian%C3%A7as.&text=Batalha%20da%20Tata%C3%ADra%20ocorreu%20na,c%C3%B3rrego%20que%20passava%20pelo%20local.
https://revistas.ufpr.br/campos/article/view/41207#:~:text=O%20movimento%20pol%C3%ADtico%20de%20Trombas,fortalecidos%20pelo%20governo%20do%20Estado.

Você também pode se interessar por