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Como os movimentos de juventude da extrema direita utilizam argumentos de gênero?
Cultura e Esporte

Como os movimentos de juventude da extrema direita utilizam argumentos de gênero?

Um projeto de pesquisa europeu busca compreender e combater o apelo da extrema direita entre os jovens

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Via UOC

Tempo de leitura: 6 minutos.

De acordo com o projeto de pesquisa europeu YOU-DARE, nos últimos anos, movimentos de extrema-direita têm utilizado, com crescente frequência, argumentos de gênero para promover ideologias excludentes e colocar em risco os valores democráticos. Esta nova iniciativa de pesquisa, que conta com a participação da Universitat Oberta de Catalunya (UOC), irá examinar como grupos juvenis de extrema-direita constroem e mobilizam identidades e significados de gênero, e como utilizam discursos para enfraquecer os valores e comportamentos democráticos.

“As eleições recentes e as pesquisas para eleições futuras em toda a Europa mostram que grande parte do apoio à extrema-direita vem de jovens, especialmente de homens jovens. Uma análise qualitativa desse fenômeno, examinando quais discursos de gênero estão sendo propagados e como se articulam com outros discursos, pode nos ajudar a entender a disseminação e a normalização de posições antidemocráticas da extrema-direita que colocam em risco direitos conquistados”, afirmou a professora Begonya Enguix, que coordena a participação da UOC neste consórcio europeu de pesquisa.

“O projeto visa identificar ações, agentes e políticas eficazes para combater os discursos da extrema-direita e fornecer aos jovens ferramentas críticas”

Financiado pela Comissão Europeia, o YOU-DARE — acrônimo de YOUth Debunking the gendered Arguments of far-Right Extremism (Jovens Desmascarando os Argumentos de Gênero do Extremismo de Extrema-direita) — busca examinar os discursos promovidos por grupos juvenis de extrema-direita, adotando uma abordagem interseccional para destacar as complexidades e contradições das construções de gênero nesses movimentos.

Um estudo com oito países europeus

O projeto realizará uma análise detalhada para questionar as visões simplistas de gênero da extrema-direita, ao mesmo tempo em que explora como estereótipos tradicionais de masculinidade e feminilidade podem coexistir com a retórica da igualdade de gênero usada, por exemplo, em campanhas anti-imigração. A pesquisa pretende mostrar como líderes juvenis, incluindo influenciadores online, moldam os discursos de gênero da extrema-direita de forma complexa, comparando-os em oito países europeus — Dinamarca, França, Hungria, Itália, Romênia, Suécia, Reino Unido e Espanha — a fim de entender como as dinâmicas locais estão ligadas às tendências globais.

O YOU-DARE não visa apenas analisar e aprender, mas também educar e prevenir, com a criação do Open Policy Lab, que desenvolverá e testará soluções para reduzir o apelo da extrema-direita entre os jovens, por meio da organização de oficinas de formação e do desenvolvimento de uma plataforma de troca de conhecimento.

Quatro processos-chave

Embora o projeto ainda esteja em seus estágios iniciais, Enguix apontou quatro processos cruciais e interligados para entender o papel do gênero nos movimentos juvenis de extrema-direita. Em primeiro lugar, a pesquisadora destaca a importância da “sensação de que há uma crise da masculinidade em sua forma tradicional, impulsionada por crises globais, pela perda do papel do homem como ‘provedor’, pelo desemprego juvenil, por mudanças políticas e pelo fracasso em atender às expectativas para o futuro, entre outros fatores.” Enguix, coordenadora do grupo de pesquisa Gêneros em Transição: Masculinidades, Afetos e Corpos (MEDUSA) da Faculdade de Artes e Humanidades da UOC, também ressaltou a relação entre essa crise e a percepção de alguns homens de que “há uma ameaça e o fim do mundo como era antes — o status que os homens desfrutavam, os privilégios que tinham e seu lugar especial na sociedade.” Ela afirmou que “o feminismo e as relações de gênero igualitárias podem ser percebidos como uma ameaça, e como responsáveis pela suposta crise da masculinidade”, e destacou que o resultado é um “sentimento masculino de vitimização que agora se torna uma posição política, polarizando a sociedade entre elites e povo, entre vitimizadores e vítimas, entre feminismo e antifeminismo, e entre culpados e inocentes.”

Ela também enfatizou que “no projeto, estamos trabalhando com base na ideia de que o alcance ampliado das redes sociais tem feito com que discursos predominantes circulem, embora com algumas características locais específicas. No caso da Espanha, e considerando que o projeto está apenas começando, a hipótese é que questões relacionadas ao gênero e à participação dos homens na conquista da igualdade parecem estar fortemente consolidadas na sociedade. Segundo estudos, incluindo o relatório sobre estereótipos de gênero do Centro de Pesquisas Sociológicas (CIS) da Espanha em 2024, os homens acreditam que tanto eles quanto as mulheres devem lutar pela igualdade de gênero como um valor democrático.”

Enguix acrescentou que o projeto também visa “identificar ações, agentes e políticas eficazes para combater os discursos da extrema-direita e fornecer ferramentas críticas para que os jovens possam resistir ao avanço da direita radical.” O YOU-DARE pretende consolidar uma análise aprofundada da extrema-direita entre os jovens na Europa e desenvolver ferramentas para neutralizar seus efeitos.

Unidos pela experiência

O consórcio YOU-DARE reúne organizações especializadas em ciências sociais, estudos de gênero, extrema-direita e pesquisa participativa de toda a Europa. Além da UOC, os membros incluem a European Science Foundation (ESF), que coordena o projeto; a European Association for Local Democracy (ALDA); Goldsmiths, University of London (Reino Unido); NetHood (Suíça); Political Capital (Hungria); Smart Venice (Itália); Aalborg University (Dinamarca); University of Bucharest (Romênia); Stockholm University (Suécia); e a University of Glasgow (Reino Unido). O consórcio tem ampla experiência em pesquisa, formulação de políticas e engajamento comunitário para enfrentar coletivamente os desafios colocados pelos movimentos juvenis de extrema-direita.

“Nosso objetivo é pesquisar e expor as narrativas de gênero da ideologia de extrema-direita e seu apelo entre os jovens, ao mesmo tempo em que fornecemos estratégias baseadas em evidências para proteger a democracia e a igualdade. O YOU-DARE representa uma colaboração de pesquisa única entre disciplinas e fronteiras, com o objetivo de gerar conhecimento robusto e acionável para a mudança”, disse a coordenadora científica do consórcio, Susi Meret, da Aalborg University.

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